“CONSTRUIR UM MUNDO MAIS JUSTO NÃO É POLÍTICA, MAS “DAR CORPO À FÉ””. (Francisco, papa)

O quarto capítulo da “Fratelli Tutti”, nos conduz a refletir sobre o sentido original e autêntico de uma política que agrega um povo e se abre ao senso de justiça, de fraternidade bem como para construir algo que articule sempre o bem comum de todo o tecido social.

Por quê?
“...o desenvolvimento de uma comunidade mundial [...] e, que vivam a amizade social, é necessária a política melhor, a política colocada a serviço do verdadeiro bem comum”. (FRANCISCO, papa - Fratelli Tutti n.154 – Ed/Paulus p.83).

E o texto segue complementando:
“...hoje, infelizmente, muitas vezes, a política assume formas que dificultam o caminho para um mundo diferente”.

Nesse sentido basta lançar o olhar para muitas Conjunturas políticas socioeconômicas, salvo sempre as exceções, descambam para os “populismos” e “liberalismos”, aliás, que são normalmente demagógicos e que servem apenas aos interesses econômicos dos poderosos. Ora, isso além de não agregar, os mesmos se fecham em seu mundo, levantam muros, principalmente em relação aos mais frágeis, muitas vezes considerando-os perigosos e mais: não respeitando as diferentes culturas.

O grave nesse aspecto é que pretendem dividir a sociedade e criando classificações de indivíduos, grupos, sociedade e governos. Daí é que emerge a divisão binária “populista” ou “não populista”.

Sem dúvida, jamais se pode admitir tal imaginário como chave de leitura para edificar uma nação próspera, inclusiva, fraterna e sustentável. Por trás disso, corre-se o risco de eliminar o sentido da palavra “democracia” que sempre significa “governo do povo”. A crítica que se faz a essa visão é que se torna urgente e necessário retomar o conceito de “povo”. A final tal palavra povo sempre vai além desse ridículo reducionismo populista,

ou seja:
“...povo tem algo mais que não se pode explicar logicamente”. Então se pergunta: O que significa pertencer a um povo?
“...é fazer parte de uma identidade comum, formada por vínculos sociais e culturais. E isso não é algo automático; muito pelo contrário: é um processo lento e difícil, rumo a um projeto comum”. (FT, n.158).

Portanto, a sociedade contemporânea deve ficar atenta ante esses populismos que nos últimos tempos se disseminaram e continua a se espalhar, através, da mídia. Por outro lado, cumpre destacar que “...existem líderes populares, capazes de interpretar o sentido de um povo, sua dinâmica cultural e as grandes tendências de uma sociedade”. (FT, n.159).

Que características tais líderes é que fazem a diferença?
“...congregam e guiam [...] e tem como base um projeto duradouro de transformação e crescimento, [e isto] implica também a capacidade de ceder o lugar a outros na busca do bem comum”. (ibidem)

O grande problema é quando tais líderes se “degeneram no populismo insano e acaba se transformando na habilidade de alguém de atrair consensos a fim de instrumentalizar politicamente a cultura de um povo, sob qualquer sinal ideológico, a serviço do seu projeto pessoal e da sua permanência no poder”.

Jamais diz Francisco, e “...longe de mim propor um populismo irresponsável”. (op cit EG n.204 in Fratelli Tutti n.161). A partir disso ele afirma que “...a superação da desigualdade requer que se desenvolva a economia, fazendo frutificar as potencialidades de cada região e assegurando assim um equilíbrio sustentável”.

O TRABALHO É UMA DIMENSÃO ESSENCIAL DA VIDA SOCIAL

Cumpre destacar que Encíclica Fratelli Tutti sempre procura frisar, ante as dificuldades da sociedade hodierna, o quanto é necessário à busca de soluções definitivas e de longo prazo e não provisórias, muito menos emergenciais. Nesse sentido é quando Francisco aponta a política como um caminho para organizar a sociedade para que os membros sejam preparados através de um trabalho digno e justo. Pois além de conseguir o próprio sustento ajuda na realização pessoal como pessoa, e, também o desenvolvimento das capacidades. A final e, em muitas ocasiões, as pessoas não possui oportunidade alguma para colocar em prática os seus talentos. Ora, infere-se daí o velho ditado: “Em vez de dar o peixe, ensine-o a pescar”. Observe caro leitor!

Na subjacência fica claro que: “...o verdadeiro objetivo deveria se sempre consentir-lhes uma vida digna através do trabalho”. (op cit Laudato SI’ n.128). E nisso fica estampado que: “...não há pobreza pior do que aquela que priva do trabalho e da dignidade do trabalho. Em uma sociedade realmente desenvolvida, o trabalho é uma dimensão essencial da vida social, porque não é só um modo de ganhar o pão, mas também um meio para o crescimento pessoal, para estabelecer relações sadias, expressas a si mesmo, partilhar os dons, sentir-se corresponsável no desenvolvimento do mundo, e, finalmente, viver como povo”.

O CORAÇÃO DO ESPÍRITO DA POLÍTICA É SEMPRE UM AMOR PREFERENCIAL AOS MENOS FAVORECIDOS.

Infelizmente, diz Francisco, frequentemente acusam como populismo todos aqueles que defendem os direitos dos mais frágeis da sociedade. E assim cria-se uma polarização desnecessária e ridícula. No entanto, “...a caridade reúne as duas dimensões – a mítica e a institucional -,pois implica um caminho eficaz de transformação da história que existe incorporar tudo: instituições, direito, técnica, experiência, contribuições profissionais, análise científica, procedimento administrativos”. (FT, 164).

E segue a justificação: Por quê?
“...de fato,, não há vida privada, se não for protegida por uma ordem pública; um lar acolhedor doméstico não tem intimidade se não estiver sob a tutela da legalidade, de um estado de tranquilidade fundado na lei e na força e com a condição de um mínimo de bem-estar garantido pela divisão do trabalho, pelas trocas comerciais, pela justiça social e pela cidadania política”. (ibidem).

Ora, de acordo com a Encíclica, é nisso que se resume a verdadeira e autêntica caridade. A final o amor ao próximo sempre é realista e não desperdiça nada do que seja necessário para uma transformação da história que beneficie os últimos. Em última análise, “...é necessário fazer crescer não só uma espiritualidade da fraternidade, mas também, e ao mesmo tempo, uma organização mundial mais eficiente para ajudar a resolver os problemas prementes dos abandonados que sofrem e morrem nos países pobres”. (FT, 165). Fica claro que é necessário um projeto educativo que leva as pessoas a desenvolver a capacidade de pensar a vida humana tendo em vista a integralidade da vida do tecido social e, com certeza, uma profunda espiritualidade, justamente, para reagir diante das injustiças, das aberrações, dos abusos dos poderes econômicos, tecnológicos, políticos e mediáticos.

A FRAGILIDADE DOS SISTEMAS MUNDIAIS NESSA PANDEMIA EVIDENCIOU QUE NEM TUDO SE RESOLVE COM A LIBERDADE DE MERCADO.

É preciso e, acima de tudo, ter coragem e a determinação de reabilitar uma política que seja saudável e que não esteja sujeita aos ditames das finanças. Infelizmente um grupo fechado em sua própria ideologia e interesse, insiste num pensamento pobre, repetitivo, principalmente, do liberalismo em manter formas fastidiosa e retrógada de administrar a economia.

Por quê?
Essa ideologia do neoliberalismo e/ou neuroliberalismo “...sempre propõe as mesmas receitas diante de qualquer problema que emerge no contexto socioeconômico”. E Francisco ainda afirma: “...o fim da história não foi como previsto, tendo as receitas dogmáticas da teoria econômica imperante demonstrado que elas mesmas não são infalíveis”. Portanto, “...devemos voltar a pôr a dignidade humana no centro e sobre aquele pilar devem ser construídas as estruturas sociais alternativas das quais precisamos”. (FT, 168).

Ora, é preciso frisar, diz a Encíclica, que “...em determinadas visões econômicas fechadas e monocromáticas, parece não ter lugar, por exemplo, os Movimentos Populares que reúnem desempregados, trabalhadores precários e informais e tantos outros que não entram facilmente nos canais já estabelecidos”. (FT, n.169).

E o mesmo segue:
“...é necessário pensar a partir da participação social, política e econômica segundo modalidades tais “que incluam os movimentos populares e animem as estruturas locais, nacionais e internacionais com aquela corrente de energia moral que nasce da integração dos excluídos na construção do destino comum”.

DAR A CADA UM, O QUE LHE É DEVIDO.

Francisco aponta na Encíclica, quando da crise financeira de 2007-2008, onde faz referência a perda da oportunidade do poder internacional de ter feito uma nova economia a partir de princípios mais éticos e com nova regulamentação, principalmente, em se tratando da atividade financeira especulativa e da riqueza virtual.

É preciso coerência em ‘dar a cada um, o que lhe é devido’ e segundo o conceito clássico de justiça, isso significa: “...que nenhum indivíduo ou grupo humano pode-se considerar onipotente, autorizado a pisar a dignidade e os direitos dos outros indivíduos ou dos grupos sociais”. (FT, 171). A Encíclica ainda aponta a necessidade e uma “...necessária reforma “quer da Organização das Nações Unidas quer da arquitetura econômica e financeira internacional, para que seja possível uma real concretização do conceito de família de nações”. (op cit Cáritas in Veritate (CV, in FT, n.173 p.92).

Em contrapartida cumpre afirmar que “…a tarefa das Nações Unidas, com base nos postulados do Preâmbulo e dos primeiros artigos de sua Carta Constitucional, pode ser vista como o desenvolvimento e a promoção da soberania do direito, sabendo que a justiça é um requisito indispensável para se realizar o ideal da fraternidade universal. [...] é preciso garantir o domínio incontrastado do direito e o recurso incansável às negociações, aos mediadores e à arbitragem, como é proposto pela Carta das Nações Unidas, verdadeira norma jurídica fundamental”. (FT, ibidem).

A POLÍTICA NÃO DEVE SUBMETER-SE À ECONOMIA

É preciso retomar o conceito positivo de política, pois somente a partir dessa mudança de postura é que vão acontecer novos ares não apenas local, mas, e, também mundial. Por quê? “...a grandeza política mostra-se quando, em momentos difíceis, se trabalha com base em grandes princípios e pensando no bem comum a longo prazo. O poder político tem muita dificuldade em assumir este dever em um projeto de nação”. (op cit Laudato SI’ n.178 in FT, 178). Portanto, é preciso ter ciência de que “...a boa política procura caminhos de construção de comunidade nos diferentes níveis da vida social, a fim de reequilibrar e reordenar a globalização para evitar seus efeitos desagregadores”. (FT, n.182).

Sempre é possível avançar para uma civilização do amor e, nisso, fica claro o quanto a caridade deve estar no centro de toda a vida social, sadia e aberta. Pois, também na política, há lugar para amar com ternura e esse é o caminho que somente homens e mulheres mais corajosos e fortes é que trilham.

Sempre é bom parar, refletir para um novo recomeço!